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Será que estamos enfrentando o maior dilema do século? Cuidar das pessoas ou produzir com baixos custos a qualquer preço? Com a grande competição pela produção com baixos custos, como ficam as pessoas?


A evolução nas relações humanas no trabalho tem muitos capítulos. Para se sair do regime de escravidão e chegarmos ao ponto dos trabalhadores participarem nas decisões das empresas, foi um longo caminho. Nem sempre as conquistas se deram de forma pacífica. Pessoas morreram em nome do respeito e da igualdade no ambiente de trabalho.

Hoje muitos líderes, sabedores das mudanças dos tempos, se preocupam com a qualidade de vida e felicidade no trabalho, falam da necessidade do trabalho ter um sentido maior ao trabalhador, entendem que a mão de obra de uma empresa é, na verdade, sua maior riqueza e chamam de capital intelectual o conhecimento produzido pelos colaboradores. Se estes assuntos estão em discussão e aperfeiçoamento nas boas organizações, é porque se compreendeu que a redução do conhecido conflito entre capital e trabalho é salutar para os resultados das organizações e de todos que delas participam.

Até bem pouco tempo, poderíamos afirmar que a valorização da pessoa humana, dentro e fora da organização, era algo irreversível, um norte a ser seguido por todos. Um caminho iluminado, onde a Gestão de Pessoas, a Responsabilidade Social e Ambiental, o Triple Bottom Line, a Governança Corporativa, a Qualidade de Vida no Trabalho, as novas legislações, entre tantas inovações, remetiam ao respeito à dignidade humana. Estes se tornavam, a cada dia, firmes pilares para a estratégia das organizações contemporâneas.

Mas, eis que as crises econômicas e financeiras estouraram aqui e ali e, o pior, em países de elite. Naqueles que há 20 anos atrás jamais se imaginaria uma situação como esta. Desemprego rondando às portas das famílias, renda das pessoas reduzindo drasticamente, perdas significativas de direitos sociais, governos e bancos pedindo ajuda financeira internacional para manterem o mínimo em funcionamento. Enfim, instalou-se nestes países um cenário triste, desolador e preocupante.

Diante de tal situação, dois caminhos se mostraram como opção para os principais governantes e líderes da Terra: manter o sistema como está ou mudar princípios e formas de agir e construir, de uma vez, um mundo novo. Um mundo possivelmente mais tecnológico, mais responsável com as pessoas e com o meio ambiente, que desenvolvesse mais rapidamente energias verdes, que fosse menos ávido com o consumo em quantidade, mas, interessado no consumo com qualidade. Um capitalismo humanizado assim, sem dúvidas, exigiria muito esforço e boa vontade de governantes, grandes empresários e investidores. Haveria resistências e, talvez, quem estivesse ganhando muito hoje pudesse não ganhar tanto num cenário que prezasse pela equidade social.

Diante deste dilema, estes grandes líderes parecerem que já se decidiram pelo caminho mais fácil, ou seja, por manter o sistema atual e tentar reverter o que parece quase irreversível, usando os mesmos princípios básicos da economia: produção e consumo em massa. Agora, com um diferencial, todos devem concorrer com novos países produtores que operam com baixo custo pelas suas condições políticas, sociais e econômicas. Inclusive, muitas das grandes empresas já mudaram suas plantas produtivas para estes países onde a mão de obra é barata, a legislação trabalhista e ambiental é frágil, onde a pobreza é tanta que se trabalha por qualquer centavo.

Ao compararmos o caminho que se mostrava como seguro; com bases no respeito humano; ao que se adotou, constata-se divergência e contradição. Com esta opção (produção em massa com baixo custo a qualquer preço) pode-se perguntar, como fica a Gestão de Pessoas, a Responsabilidade Social e Ambiental, o Triple Bottom Line, a Governança Corporativa, a Qualidade de Vida no Trabalho, a Promoção da Saúde e as legislações modernas em defesa da vida humana? Será que este caminho adotado é realmente seguro ou é um grande retrocesso da humanidade?

Será que estas mudanças não causarão desemprego em massa nos países de origem das indústrias que estão se mudando para os países com salários menores? Será que a entrada, em grande quantidade, de produtos feitos nestes países não levará à falência muitas pequenas e médias indústrias nacionais? Será que, na tentativa de competir com o produto barato que vem de fora, os empresários nacionais não sejam obrigados a desrespeitar a legislação trabalhista, ambiental e tributária para também reduzirem seus custos e preços? Será que a sonegação de impostos não aumentará mais ainda por conta deste novo cenário? Será que a crise internacional ao invés de ser resolvida, não será socializada? Será que não estamos nivelando por baixo, e não por cima, como antes tentávamos fazer?

Diante destas duas opções: cuidar das pessoas ou produzir com baixos custos, boa parte das organizações e seus gestores acaba tentando atender ambas as demandas, mas, sabe-se que isso não é fácil. Os que decidem por agir mais humanamente, certamente estão tendo impactos em seus custos, especialmente, se estiverem realizando a correta arrecadação de impostos. Isso pode estar implicando na formação do preço dos seus produtos, deixando-os cada vez menos competitivos. A saída talvez seja convencer seus consumidores de que estão fazendo o que é certo e assim consigam manter um público cativo, disposto a pagar um preço maior por acreditar que estão fazendo o certo. Algo extremamente desafiador a estas empresas.

Os que decidem por continuar com a produção em massa buscando redução de custos e oferta de produtos com baixos preços no curto prazo poderão estar contribuindo com a piora das condições gerais de emprego: oferta, salários e benefícios; redução de arrecadação tributária, desrespeito às leis ambientais e piora geral das condições econômicas do país no longo prazo. A segunda opção parece mais aderente à lógica atual de competitividade, ou seja, é um terreno inóspito, mas, conhecido pela maioria. Já a primeira, custa caro, e por isso, nem todos estão dispostos a pagar.

Este então, parece se mostrar como um dos maiores dilemas do século enfrentado por governantes e gestores nas organizações. Toda decisão tem consequências, contudo, espera-se que eles decidam sempre de forma justa, coerente com os valores que deveriam sustentar a humanidade e que dão sentido à vida neste planeta tão belo.


Por Adolfo Plinio Pereira, Professor Universitário e Consultor Técnico de conteúdo na Faculdade Pitágoras e Diretor na Adolfo Pereira Consultoria.

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